sexta-feira, 14 de novembro de 2008





Pra você ter paciência

E se você me habita
eu viro casa;
Se você me voa eu viro asa
Se chega num repente e espanta
antes de assustar, encanta.
Um beijo e eu viro brasa.

Se me tenta com sussurro
lanço-me ao queixo da razão.
De coração em riste,
Eu: murro.

Ah!
E se por acaso me ama
Diz, e eu borbulho em mil:
viro tua lua, pão e carinho
flor anis, ausente de espinho
vento sigo e através,
Eu: passarinho.

De se em se me transformo,
eu viro-metamorfoseio.
Feito espelho de querer bem
se você diz que me ama,
Eu, tua amante, viro amor.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008



*Photo: Keith Levit


Flores

Eu lhe disse que não gosto de ganhar flores. Porque elas são frágeis. Elas me lembram que a fragilidade existe e que mora, antes de na pétala fina e tenra, em mim. Sinto pena de as coitadinhas, simplesmente nascidas e existentes, serem arrancadas para você mostrar que me gosta. É que quase toda mulher gosta de flores, mas eu fiquei entre ‘quase’ e ‘toda’, num espaço certeiro, onde só pode morar um senão. E elas ficam tão bem, sob o sol e chuva então, deixe que elas fiquem. São fortes: só por isso merecem ficar. Entendi que você me gosta, mas foi num olhar dia desses, durante uma de nossas longas conversas. Vou te confiar um segredo, se é que minha visão sobre as lindas flores já não o delatou. Eu, eu preciso de proteção, embora não pareça. Mas não sei pedir se não for através de um olhar altivo, um ar confiante. É que às vezes eu sou. Mas não é sempre.
Um dia aprendo simplesmente a sentir (porque as flores trouxeram consigo a mensagem, a lembrança). Mas enquanto não, eu, coração na boca e travestida de semblante austero, fico aqui, refletindo sobre flores de aparência frágil, mas resistentes a tempestades. Olho-as com estranheza e certa inveja da sua falta de afetação. Me reconheço em seu avesso, fortaleza revestindo o tênue. Insisto nesse gris encobrindo de segurança questionável minhas cores e pétalas pequeninas.
Perdoe-me pelo não agradecimento direto, pela aparente falta de modos. É disfarce da fragilidade.
É que eu sou, antes de mais nada, uma flor ao contrário.